Tem pessoas que a gente gosta de graça. Sem fazer a menor força. Mesmo sem conhecer de perto. Mesmo sem nunca ter saído pra tomar um café, como fazem os amigos. Mesmo sem ter o mesmo sangue correndo nas veias ou lugar certo no almoço de domingo. Mesmo sem nunca ter conversado, pode? Pode. Algumas pessoas se fazem gostar (eu diria até amar) naturalmente, por unanimidade, pelo jeito especial que têm de tocar o coração da gente e acender uma afinidade que não tem tamanho nem volta.
Assim era o Boechat pra mim. Parte da minha rotina, do meu bom dia. Ele “ia” comigo no trajeto da escola, levando os meus filhos. Dali “seguíamos” para o consultório, e era como se a gente fosse mesmo conversando através do rádio, uma prosa e sintonia boa. Com ele eu ria, chorava, me indignava com algumas notícias do nosso país. Com ele eu sentia uma força, uma firmeza, uma cumplicidade em pensar do mesmo jeito.
Há 4 anos eu escrevi sobre o Boechat aqui no blog. Foi quando ele teve um surto depressivo e ficou fora do ar por algumas semanas. Em meio à enxurrada de mensagens que chegou à rádio questionando o seu sumiço, uma se destacou: a de uma ouvinte compartilhando a pergunta da filha a caminho da escola: “Mamãe, o Boechat virou estrelinha?”
4 anos depois, no susto e na notícia que atravessa o peito, o céu nos rouba Boechat para brilhar lá em cima, dessa vez. Ele parte e o que fica é FALTA. Uma imensa e gigantesca FALTA. Perdemos sua voz, seu bom dia, seu boa noite. Perdemos sua presença marcante, sua verdade, sua grande porção de humanidade. Perdemos suas palavras, que tanto falavam por nós.
Obrigada por tudo, Boechat, e descanse em paz. Que a sua luz nos sirva de farol pra que a gente continue “tocando o barco”, como você sempre pedia e gostava de dizer.
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