Não gosto de lutas, nunca gostei. A violência (embora institucionalizada, por muitos apreciada) do corpo-a-corpo em busca de gloriosos nocautes nunca me apeteceu.
Me emociono mesmo com as lutas a que assisto diariamente: gente que luta para ser feliz, para se descobrir, para romper com a dor, para se libertar da escravidão e curar suas feridas. Gente que tem que socar a almofada mil vezes para não morrer de raiva; que range os dentes, chora e espalha sementes, acreditando que a terra é fértil e nela tudo dá.
Mesmo sem gostar, me peguei envolvida com a luta de UFC entre a americana Ronda Rousey e a brasileira Bethe Correia. A luta me fisgou quando soube do conflito que a antecedia: a brasileira, em uma alusão cruel ao pai de sua adversária, que se suicidou quando ela tinha oito anos, fez uma provocação desumana diante das câmeras: “Espero que ela não se mate depois que eu derrotá-la”.
Minutos antes de o espetáculo efetivamente começar, fiquei “filmando” as expressões de cada uma, tão distintas e claras. De um lado, Ronda Rousey com o semblante de quem carregava a alma ressentida, ferida, visivelmente doída; de outro, com ar de vitória cantada antes da hora, Bethe Correia encarava a adversária do alto de sua mais ostensiva arrogância. Salto agulha atraindo olhares no ringue.
Trinta e quatro segundos após o início da luta, a brasileira estava ao chão. Nocauteada pela sua gigantesca soberba, não percebeu que algumas coisas vão além do peso da luva, do tempo de treino ou da disputa pura e simplesmente, mas dizem respeito às emoções que carregamos no peito.
Mexeu com o pai mexeu com a filha. Completamente desprovida de razão e sensibilidade, Bethe tocou num assunto que definitivamente não lhe pertencia. Perdeu a esportiva, o bom senso, a luta e até a torcida. (O que não faltou foi solidariedade dos brasileiros em relação à Ronda Rousey e à dor que a adversária lhe causou. Ferida exposta.)
Seja qual for a sua luta, por mais pesada e sofrida, o que te mantém de pé é a postura com que você vai pro ringue. Entre em contato com a sua dignidade, seus valores mais nobres e humanos, e a vitória é sua.
Você pode até carregar pedras, mas ganhará asas.
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