“Penso, logo existo.” Hesito. Complico. Devaneio. Desisto.
Com todo o respeito, Descartes, existir é pouco para uma mente pensante. Abundante. Falante.
Ultimamente as cabeças têm doído de tanto pensar, sou testemunha. Além de todos os neurônios, circuitos e sinapses que já agitam tanto a massa cinzenta; além de todas os números, senhas, registros, listinhas e memórias; além de todas as palavras, frases e vírgulas nem sempre postas que fabricam nosso pensamento acelerado; além de tudo, tanto, tudo, ainda há monstros, fantasmas, bichos de sete cabeças habitando homens de uma cabeça só.
Contrariando sua lógica cartesiana, postulo a tese de que uma cabeça assombrada faz ponte direta com o coração. É fato. E nesse encontro ela quase mata o coitado de susto, de medo, de angústia em estado bruto. (Conhece?) Quase um choque anafilático, cabeça versus coração. E viva o dilema: “você quer ser feliz ou quer ter razão?”
Não tão simples assim. Sufocado, enfraquecido, espremido, é assim que o seu coração passa a bater.
E se o pensamento ainda resolve chamar a imaginação para um “blá”, aí é que a cabeça vira uma enorme tela de cinema. Filme de terror, prepare-se. Com direito a efeitos especiais, ruídos ensurdecedores, baforada de dragão, destroços de guerra, Oscar de pior roteiro. Entre a vida real e a que se passa dentro da sua cabeça, abre-se um abismo sem fim. Sim, nem queira ver. Lá dentro tudo muito maior, mais complicado, mais pesado, à beira do inviável. “Cortem as cabeças”, esbravejaria a rainha de Alice no País das Maravilhas. Acendam as luzes, imploraria um coração cheio de lucidez e medo.
“Penso, logo existo.” “Existo, logo sofro”, se me permite complementar sua nobre e racional filosofia.
Tantos “ses”, tantos “senões”, labirintos e encruzilhadas, esconderijos e estilhaços se ocultam em um sistema nervoso cada vez mais nervoso. Almofadas macias e chá de camomila, por favor.
A cada pensamento seu há um sentimento correspondente, esta é a lógica. E por mais que ele pareça ser o intruso que arromba a porta e faz seu coração de refém, deixando monstros e bichos horrendos de vigília, seu pensamento é você que fabrica. Enredo, cenário, efeitos especiais, tudo é autoria sua. Nada de ficção científica.
O chá está pronto.
Respira fundo, acende a luz, reinvente o roteiro.
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