Há um tempo que não volta. O tempo do ontem, das memórias guardadas, das palavras não ditas, do beijo interrompido. O tempo do talvez que ficou perdido na própria indagação, das perguntas sem resposta, da labuta vivida, dos registros mais lindos.
Na sala de TV, desviando o meu olhar das quase sempre má notícias, um porta-retrato digital rouba a cena. E ali, naquele álbum vivo, cheio de cores e movimento, vejo resvalar o tempo. Por um instante desço no toboágua com o meu filho, carrego a minha filha no colo, esquento a mamadeira, deixo os dois com a avó e vou namorar em Paris, logo ali. Por um instante sou outono, primavera, semblante sério, rugas de tanto rir. Sou dona de cachorro, sou noiva jogando o buquê, sou dona do meu nariz. Quantos minutos, segundos, quantos calendários já passaram por mim?
Nessa hora já nem escuto o noticiário, apenas me vejo em retrospectiva pelo vidro daquele porta-retrato pós-moderno, “na minha época” eles eram estáticos e de madeira. E nesse tempo que não volta (será que não volta?) sou casa nova, ponte, construção, abraço de pai, bênção de mãe, paz e cantoria, pausa e travessia. Sou dez, vinte anos atrás, sou pôr do sol se pondo em mim.
Há um tempo que fica. Pra sempre. Ad aeternum o afeto desvelado, as coisas verdadeiras, o amor cultivado por mãos de jardineiros.
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