
Eu nunca gostei do Ney Matogrosso. Nem desgostei. Respeito sempre tive, vide meus olhos admirados de menina pousando sobre aquela figura excêntrica, dona de uma voz singular, chacoalhando o corpo no Programa do Chacrinha.
Até que fui assistir "Homem com H" e saí do cinema querendo ligar pra ele: "-Oi, Ney, quer ser meu amigo? Vem almoçar comigo lá em casa, domingo, faço um churrasco pra você."
Saí com o coração cheio, tomada de afeto por esse homem de 83 anos que faz shows até hoje (!) e que um dia foi um menino cativante, de olhos cheios de brilho e encantamento pela vida. (A mesma vida que desde cedo o colocou diante de uma relação conflituosa com um pai autoritário, castrador e agressivo. Prato cheio - quase um banquete - para essa psicóloga que vos fala.)
Tenho indicado bastante o filme no consultório, especialmente por dois aspectos fundamentais que compõem a nossa condição humana:
1- Sua verdade, seu caminho, seus sonhos. Como você tem lidado com isso? Ney Matogrosso bancou a sua verdade de forma primorosa.
2- Sua reatividade - como você costuma devolver as pedras que a vida por vezes te lança? Ney Matogrosso respondia com serenidade, assertividade e firmeza, sem alterar o tom de voz. (Alterava apenas quando cantava - notas agudas executadas com maestria.)
Saindo do consultório e voltando pro escurinho do cinema, posso dizer que ri, chorei, deixei o pacote de pipoca cair no chão. Muita emoção.
Que história de vida. Que coisa mais linda ver no que esse menino se transformou.
Sem dar spoiler, termino com a frase que encerra o filme minutos antes de subirem os letreiros: “Para Ney Matogrosso, pela ousadia de ser livre.”
Lindeza de liberdade.
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