“Amo você.”
“Mande notícias.”
“Estou com saudade.”
“Como foi a prova?”
Merece um prêmio quem inventou o celular. Além de falar, o bichinho ainda escreve, fotografa, reúne os amigos, prevê o tempo, chama pra jantar e faz declaração de amor. No meu caso, ainda agenda e cancela horários, divulga cursos, publica comentários no blog, dá recados como ninguém: uma senhora secretária.
Viva a tecnologia e todos os seus instigantes recursos comunicativos, integradores, convergentes, aproximativos, revolucionários. Ai de mim sem o celular.
Mas o danado parece ter virado extensão de gente. Virou presença indispensável, viciante no restaurante, no clube, na praia, na escola, no trânsito e muitos etceteras mais.
Você já deve ter visto (se não vivido, fale a verdade) esta cena antes: almoço de domingo, família reunida, crianças brincando isoladamente entretidas com o seu game favorito.
Jantarzinho à luz de velas, flores enfeitando a mesa, um lindo casal e nada de olhos nos olhos. Parecem mesmo apaixonados é pelo que vêem cada qual na sua telinha. “Cada um no seu quadrado.”
Se preferir uma cena menos romântica, vamos ao boteco. “Ok, você venceu, batata frita.” Enquanto o chope gelado não chega, a relação esfria sem que o casal se dê conta, absortos que estão os dois com seus distintos amigos virtuais. O que era para ser um almoço a dois vira uma silenciosa confraternização a quatro, cinco, quando não uma ruidosa reunião de família sonorizada por alegres apitos. Se as crianças fazem parte do programa, perigo na certa: outro dia presenciei um pai e uma mãe que não desgrudavam o olho do celular enquanto a filha de aproximadamente três anos se divertia com a faca, o primeiro brinquedinho que viu pela frente. “Garçon, a conta.”
Hora do rush, trânsito atrapalhado, namorado resolve mandar mensagem pra namorada e “crush” (nada “candy”) no carro da frente.
Mãe saindo da natação com a filha: ao invés de dar a mão para a pequena, a moça segura firme o celular enquanto vai deslizando absorta o dedo na tela, mergulhada talvez no Facebook, WhatsApp, talvez um e-mail urgente. Nem vê o tombo que a menina leva, solta soltinha no mundo. What’s up?!
Os conectadíssimos de plantão que me desculpem, mas está ficando deselegante. Está ficando desagradável, preocupante. Está ficando um tanto quanto sem noção, sem etiqueta, sem limite. Já virou transtorno psíquico e está enchendo as clínicas. Tem gente precisando de tratamento.
O uso exagerado dessas tecnologias já entrou no rol do patológico, do excesso que vicia, do fracasso escolar e do enfraquecimento das relações afetivas, me desculpe se estou sendo desmancha-prazeres. “Aprecie com moderação”, desafio os publicitários a criarem um novo jargão nas suas campanhas de conscientização. Divulguem nas redes socias, o retorno será certo. Sugestão de slogan: “Tudo o que conecta desconecta.”
Com todo o respeito à inteligência e “mil e uma utilidades” dos mais smarts dos smarts, deixo registrado aqui meu tributo à vida ( “é bonita, é bonita e é bonita”) ao vivo e em cores, com tudo de mais genuíno que ela provê – toque, cheiro, abraço, emoção, mãos dadas, olhos nos olhos, riso, rio, carpe diem, “como foi seu dia?”, conversa jogada fora, sintonia boa, brincadeira de criança, sol nascendo, sol morrendo, banho de chuva pra recarregar as baterias, tintim fazendo estalo, amizade fazendo todo o sentido.
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