
Algumas pessoas costumam estranhar. “Duas portas?” Sim, e com revestimento acústico, para que nada que se fale aqui dentro seja ouvido lá fora. Nem por uma mosca, costumo dizer.
Sim, segredo é sagrado. Basta uma pequena mudança de vogal para expressar a dimensão que é se assentar diante de alguém e escutar o que o seu coração, tantas vezes espremido e abarrotado, traz. Seja o passado, o presente, o futuro tão cheio de incertezas. Seja a dor, o amor, a culpa, o medo, a tristeza, o desespero, o dissabor. Seja não saber ainda quem se é, ou o que se quer. Seja simplesmente olhar para o chão e chorar, sem nada precisar dizer.
É nessa sala cheia de almofadas, segredos, flores, livros e potes de sentimentos na estante que transformações profundas começam a se processar, muitas vezes de forma silenciosa e imperceptível.
De uma semana a outra, não é raro que eu escute:
– Você falou uma coisa na sessão anterior que não saiu da minha cabeça…
– Você acha que eu vou dar conta? Que eu posso mesmo ter esperança?
– Tive um insight. Daqueles!…
– Ainda não estou vendo mudanças… Eu queria tanto que as coisas acontecessem mais depressa… Que um milagre acontecesse.
– Aqui fica tudo claro pra mim, simples de entender… mas na hora de colocar em prática é tão difícil…
Terapia é um processo fluido. É dia e noite, um dia de cada vez, tempestade e calmaria, rio a desaguar no mar. É encontro consigo mesmo. É descobrir aos poucos quem você é. É se implicar com as suas questões mais internas, mais escondidas, para lidar melhor com as questões que a vida te convida a viver: relacionamentos, conflitos, buscas, vazios, interrogações, abismos, encontros e desencontros.
Da porta pra dentro, refúgio. Janelas abertas para o sol entrar. Da sala pra fora, trabalho. Trabalho árduo, mãos à obra, é da porta pra fora que a terapia realmente começa.
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