Palavras abraçam. Aproximam. Acolhem. Fazem do silêncio ponte, do coração tradução, da dor um caminho.

Renata Feldman faz das palavras matéria-prima. Seu trabalho é feito de escuta, acolhida, interação, escrita.

Seja no refúgio da psicologia clínica, nos livros publicados ou posts aqui do blog, palavra é preciosidade.

Entre, aconchegue-se e fique à vontade. É uma alegria dividir este espaço com você.

Flor decorativa
Amor

Carta de amor

13 September, 2011

Querido Neruda,

Quando você se foi eu ainda nem havia nascido. Dizem que morreu de tristeza, dessas mortes que cabem bem aos poetas. Cheguei nove meses depois, e outros tantos anos aqui estou, sentada de frente pro mar, pensando no que os seus olhos viam quando também enxergavam a beleza de Viña del Mar. De um lado, a beleza do Oceano Pacífico que rega o seu Chile de congrios e ceviches. De outro, tão perto daqui, em Santiago, a força da Cordilheira dos Andes que nos encanta com o seu pranto perene de neve.
Inspirada em você, querido Pablo, dei um “pause” na rotina e vim viver o amor com todas as letras, versos, prosas e canções. Não foi isso que você escreveu? “Vinte poemas de amor e uma canção desesperada.” Imagino o quanto você amou e rimou o amor e a dor com sua alma de poeta, merece-dor do Prêmio Nobel da Paz. Sim, querido Neruda, o amor um dia acaba desaguando num oceano imenso de paz. Mesmo que no caminho doa, sofra, caia, morra, se descabele. Não é assim que você chamava a sua terceira mulher? La Chascona, a descabelada. Sim, querido poeta, o amor vira os enamorados pelo avesso.
Fui até a sua casa, estava fechada. Vou tentar amanhã, em Valparaíso, convidada que já me sinto a adentrar um pouco mais na sua vida, respirando cada canto de poesia que ainda hoje deve habitar La Sebastiana.
Pois bem. Vim escrever um pouco mais da minha história no seu chão que é repleto dela. E olhando pra esse marzão aqui na minha frente, abro uma garrafa de vinho, me lembro de Iemanjá (se você tivesse mais uma casa, este nome cairia bem) e brindo com você o amor que um dia, em suas memórias póstumas, você “confessa ter vivido”.
E já que estou aqui, viva, vivinha da silva, bebendo na fonte da sua poesia, que eu não precise morrer para confessar a imensidão de amor que dentro de mim é mar e montanha, céu e chão, paz e revolução.
Adeus.

P.S: Um tanto de amor acho que aprendi com você.
P.S´: Relendo o post hoje de manhã, vi que “te dei” o Prêmio Nobel da Paz, quando na verdade você ganhou foi o Prêmio Nobel de Literatura. (…). Não importa. Quem tanto já falou de amor, quem tanto fez poema com o mar merecia mesmo dez Nobeis da Paz. O prêmio é todo nosso, querido Neruda.

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