Ando cuidando do meu coração. Um histórico genético envolvendo colesterol alto premiou quase que a família inteira. Meu pai comemora todo ano o aniversário das suas 4 pontes de safena, já contei por aqui. Um tio-avô pianista (também da linhagem paterna) teve um infarto em pleno recital, não dá mesmo pra descuidar.
Meu cardiologista pediu ecocardiograma, ergométrico e uma angiotomografia coronariana. Foi além do triglicérides, LDL, HDL. Foi cuidadoso. Foi nota mil. Dei a ele prontamente um lugar no meu coração. Obrigada, Dr. André Chuster.
Já do hospital que escolhi para realizar o exame não posso dizer o mesmo. Falharam comigo na comunicação, na atenção, no atendimento. A história é longa e indigesta, prefiro não entrar em detalhes por aqui. Prefiro deixar ir.
Mas o resumo da ópera (bem desafinada, inclusive) é que depois de quase 2 horas de atraso, estando há 4 em jejum, toda uma agenda reprogramada, o médico simplesmente não apareceu. Mandou dizer que estava almoçando e que ficaria a meu critério remarcar o exame. Reportei o caso à ouvidoria, compartilhando minha profunda decepção. Recebi de volta um profundo e desagradável silêncio.
Exame reagendado, é claro que dessa vez em outra instituição. Não poderia ter sido melhor acolhida, e ainda comemorei o resultado. Artérias tinindo, deu vontade de emoldurar a imagem. Não sabia que o meu coração era tão bonito.
E assim vamos vivendo. Pulsando alegria e gratidão quando o cuidado nos toca; sentindo muito – peso, lamento, indignação, decepção, raiva, tristeza – quando a negligência toma a cena.
Para além das relações profissionais – em que o cuidado se faz tão importante quanto a competência, prezo isso desde sempre – convido você a pensar na dimensão que essa palavra preciosa anda ocupando na sua vida. Nas suas relações. A começar pela relação com você mesmo(a): corpo, mente, alma, coração. (Vai bem, obrigado?) Sono, rotina, casa, descanso, autoestima, alimentação. (Vai um açaí aí?)
E sua relação amorosa, como vai? Positivo operante? Cuidado presente nas palavras, nos detalhes, no olhar, nos gestos mais simples? “Quem sabe isso quer dizer amor”, evocando nosso querido Milton Nascimento para esta conversa. Ou Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, em “Cuide bem do seu amor”.
Das relações amorosas para as familiares, afetivas, interpessoais, é um pulo. Ou uma alegre batida de coração quando se tem cuidado. Eita palavra linda, especialmente quando colocada em prática. Só discurso adianta não.
Seja caminhando, cantando, dormindo, acordando, trabalhando, amando, qualquer gerúndio vale a pena quando a gente cuida.
Termino essa conversa deixando um abraço para você e uma frase que vivo dizendo, quase um mantra para quem convive comigo: Cuide-se bem. 🌷
Clara Feldman says
Ô filha, mais um texto lindo! E, você sabe, me toca especialmente. Não foi por acaso que dei aula de “Relação Médico-paciente “ até me aposentar. Não foi por acaso que escrevi um livro sobre o tema. Seu texto, além de lindo e bem escrito, como sempre, é necessário. Muuuuuuito necessário, mais do que necessário! Tudo o que quero é mandá-lo para o hospital. Isso, para mim, é exercício de cidadania. Você mandaria? Se não, posso eu mandá-lo? Vi que você não colocou os nomes, nem do hospital ruim – péssimo – nem do bom…você sabe também que ando muito mais brava que você. É isso mesmo? Pode colocar não? Beijo, sua mãe.
Renata Feldman says
Aprendo tanto até hoje com você, mãe. Muito provavelmente esse texto veio desse aprendizado também. Cuidado é uma palavra que sempre vi em você, em tudo.
Perdi um pouco da graça com o hospital, já não espero dele resposta. (Quando esperei não tive, não sei se será dessa vez…).
Pode mandar, se quiser. Com a braveza de mãe que você sempre teve e com a propriedade de quem já ensinou muito médico a cuidar do lado humano também, muito além da técnica. Mande junto do seu livro, “Atendendo o Paciente”, quem sabe assim eles possam se tocar. Se sentirem tocados, especialmente.
Quanto aos nomes, é mesmo um dever de cidadania escrevê-los aqui, com todas as letras. Hospital Felício Rocho, quem me inspirou (infelizmente) a escrever esse post. E Hospital da Unimed, a quem devo meu reconhecimento e gratidão pelo cuidado com que fui tratada, atendida, acolhida.
Beijo, sua filha.